REGIMENTO ESCOLAR – Fundamentos legais, conceito, conteúdo e impedimentos

Regimento Escolar é o conjunto das normas que regem o funcionamento e os serviços de um estabelecimento de ensino, de acordo com os princípios, fins e objetivos da educação e o projeto político pedagógico da escola. Quando de sua elaboração deverá individualizar a unidade escolar na apresentação de sua filosofia, seus objetivos e na descrição de sua organização pedagógica, administrativa, didática e disciplinar e expressar a filosofia norteadora da escola dentro de seu contexto e realidade escolar.

CONSULTA

O consulente pede que se aponte os fundamentos legais para elaboração do Regimento Escolar de unidade de ensino localizada no município de Toledo, Estado do Paraná, seu conceito, requisitos, conteúdo e impedimentos.

PARECER

1. A normatização do Regimento Escolar foi inicialmente prevista na Lei n° 5.692/71 (Fixa Diretrizes e Bases para o ensino de 1° e 2º graus, e dá outras providências), que em seu Art. 2°, Parágrafo Único, estabelecia: “A organização administrativa, didática e disciplinar de cada estabelecimento de ensino será regulada no respectivo regimento, a ser aprovado pelo órgão próprio do sistema, com observância de normas fixadas pelo respectivo Conselho de Educação” [sem grifos no original].

A Lei de diretrizes e bases da educação nacional em vigor, Lei nº 9.394/96, conquanto não tenha dado tratamento minudente ao Regimento Escolar, a ele faz referência em vários de seus dispositivos.

No Estado do Paraná a elaboração do Regimento Escolar dos estabelecimentos de ensino de 1° e 2° graus foi normatizada pela primeira vez por meio da Deliberação n° 27/72, do Conselho Estadual de Educação. Posteriormente, tratando do tema, vieram as Deliberações de n° 020/91, n° 002/96 e n° 016/99, atualmente em vigor.

No Município de Toledo, as normas para elaboração do Regimento Escolar das instituições de educação infantil e das escolas municipais de ensino fundamental estão previstas na Deliberação n° 002/05 do Conselho Municipal de Educação.

2. Os regimentos são atos administrativos normativos de atuação interna e se destinam a “disciplinar o funcionamento dos serviços públicos, acrescentando às leis e regulamentos disposições de pormenor e de natureza principalmente prática”[1].

Nesse sentido, e com mais precisão, o Art. 2° da Deliberação n° 002/05-CME-TOLEDO prescreve que “o Regimento Escolar é o conjunto das normas que regem o funcionamento e os serviços de um estabelecimento de ensino, de acordo com os princípios, fins e objetivos da educação e o projeto político pedagógico da escola”.

Já nos termos da Deliberação n° 016/99, do Conselho Estadual de Educação, os Regimentos Escolares, observados os princípios constitucionais, a legislação geral e as normas especificas, têm por fim regular “a organização administrativa, didática e disciplinar dos estabelecimentos do Sistema Estadual de Ensino do Paraná” (Art. 1°).

3. Enfatize-se, ainda, que o Regimento Escolar é um instrumento que individualiza os diversos estabelecimentos de ensino, define sua filosofia, objetivos e organização administrativa, didática e disciplinar, é, em suma, o instrumento legal que organiza e define a escola.

É o que diz expressamente o Art. 2° da Deliberação n° 002/05-CME-TOLEDO: O Regimento Escolar deverá individualizar a escola na apresentação de sua filosofia, seus objetivos e na descrição de sua organização pedagógica, administrativa, didática e disciplinar” e “expressar a filosofia norteadora da escola dentro de seu contexto e realidade escolar”. (Art. 2°, parágrafo único, incisos II e III) [sem grifos no original].

Esta individualização decorre do princípio de descentralização que permite a autonomia de cada estabelecimento de ensino. Isto faz surgir “uma nova fase para o ensino brasileiro, pois da autonomia conferida emanará uma nova escola, que atenderá aos objetivos determinados pelas peculiaridades locais, pelas diversidades regionais. Se isto representa, de fato, uma liberdade desejável, acarreta uma grande responsabilidade aos administradores e professores, estimulando-lhes a criatividade e o perfeito entendimento da estrutura e do funcionamento da escola, fazendo com que esta responda aos objetivos educacionais e aos anseios da comunidade a que serve”[2].

Em respeito à referida autonomia e individualidade de cada estabelecimento de ensino é vedada a confecção de regimento escolar único. É o que prevê a Deliberação n° 002/05-CME-TOLEDO ao dispor que “a elaboração do Regimento Escolar, por expressar a organização da forma jurídica e político pedagógica da sua unidade escolar, é atribuição especifica de cada estabelecimento de ensino” (Art. 1°, §1°), sendo vedada, por conseguinte, “a elaboração de Regimento Escolar único para as escolas da rede municipal ou para um conjunto de estabelecimentos” (Art. 1°, §2°).

Ademais, importa frisar que a Deliberação n° 002/05-CME-TOLEDO cuidou de preservar a autonomia e individualidade de cada estabelecimento de ensino ao ressalvar que embora seja cometido à Secretaria Municipal de Educação de Toledo, “aprovar, através de atos próprios, os Regimentos Escolares dos estabelecimentos de ensino vinculados ao Sistema Municipal de Ensino” (Art. 14), “a análise para aprovação, deve limitar-se à legalidade das disposições regimentais, vedada sua apreciação do ponto de vista organizacional, pedagógico ou filosófico (§1°) [sem grifos no original].

Outrossim, salienta-se que a Lei de Diretrizes e Bases (Lei nº 9.394/96) conferiu significativa margem de autonomia aos estabelecimentos de ensino, estabelecendo em seu Art. 12 que são eles que devem, por exemplo, elaborar suas propostas pedagógicas, das quais o Regimento Escolar é reflexo, e são responsáveis pela administração de seus profissionais e de seus recursos materiais e financeiros.

Contudo, referida autonomia não é absoluta e encontra óbice em diversos diplomas legais. É o que se extrai do Parecer n° 003/05-CME, aprovado em 13 de abril de 2005, de relatoria dos Conselheiros Flávio Vendelino Scherer e Marli Wagner, ao comentar o referido Art. 12 da Lei nº 9.394/96:

Os limites dessa autonomia, entretanto, são claros: devem ser respeitadas, além das normas federais, aquelas baixadas por cada sistema de ensino. Portanto, o artigo favorece a autonomia escolar, mas, ao mesmo tempo, propicia à administração dos sistemas de ensino os meios de regulá-la. Deste modo, embora se deva implementar um processo de descentralização em benefício das escolas, não se deve perder a visão de conjunto. Descentralização não significa abandono ou deficiência normativa. Os órgãos centrais dos sistemas de ensino têm importante papel a desempenhar num contexto maior de autonomia escolar, mediante a promoção da equidade nas oportunidades educacionais, a avaliação da qualidade da educação oferecida e a garantia do cumprimento fiel da legislação em vigor [sem grifos no original].

4. No que tange aos assuntos a serem tratados e sua disposição no bojo do Regimento Escolar, após determinar que este “obedecerá à forma legislativa apropriada, devendo ter uma ordem lógica e coerente, sequencia por assuntos, do geral para o particular, sendo desenvolvido por preâmbulos e títulos, capítulos e seções, compostos por artigos e parágrafos, incisos e alíneas, conforme o caso” (Art. 4°), a Deliberação n° 002/05-CME-TOLEDO estabelece que a forma adotada para o regimento escolar deverá conter:

I – um Preâmbulo, no qual figure: a) identificação do estabelecimento, com a indicação dos atos que autorizam seu funcionamento; b) a localização e histórico do estabelecimento; c) fins e objetivos.

II – os elementos constitutivos da organização escolar, a saber: a) gestão; b) organização pedagógica; c) organização administrativa; d) organização didática.

III – a descrição dos direitos e deveres dos membros da comunidade escolar.

IV – o elenco das disposições gerais e das disposições transitórias, quando houver” (parágrafo único) [sem grifos no original].

Parece-nos conveniente sublinhar que o Regimento Escolar deverá ser um instrumento dinâmico. Os resultados das experiências pedagógicas e administrativas deverão servir para reformá-lo e atualizá-lo, sempre que se fizer necessário. A esse respeito preleciona o Conselheiro Arthur Fonseca Filho, do Conselho  Estadual de Educação (SP), em seu voto como relator da Indicação CEE Nº 13/97[3]: “o Regimento Escolar, por ser um documento com eficácia na regulação das relações de todos os envolvidos no processo educativo, deve ser redigido de maneira clara, destituído de particularidades que são apenas conjunturais. Por ser ato administrativo e normativo de uma unidade escolar deve expressar ou assentar-se sobre os propósitos, as diretrizes e princípios estabelecidos na proposta pedagógica. É documento redigido para perdurar, embora possa sofrer alterações e acréscimos [sem grifos no original].

Para orientação daqueles que receberão a tarefa de elabora os regimentos escolares, servimo-nos de uma advertência salutar:

O regimento será tanto mais adequado quanto menos for omisso em relação a aspectos essenciais do processo educativo e quanto for mais hábil na colocação de determinados problemas.

Um regimento demasiadamente analítico poderá ser coibidor da própria liberdade da escola. Se exageradamente sucinto poderá acarretar sérias dificuldades à orientação do processo educativo.

Bom senso para adoção da justa medida e qualificação de quem for elaborar o regimento são fatores importantes.

A contribuição própria e pessoal, a experiência pedagógica, o conhecimento da legislação e a consciência do uso adequado que deve fazer da liberdade que a legislação lhe outorga são a medida exata para a elaboração de um bom regimento[4] [sem grifos no original].

5. Sabe-se, contudo, que a maior dificuldade encontrada na elaboração de um Regimento Escolar, e que, por isso, demanda maior cuidado, é saber com exatidão o que fazer nele constar em matéria disciplinar. Quais as condutas que devem ser tidas como proibidas? Quais as sanções a serem aplicadas em caso de sua violação? O assunto é deveras delicado e têm suscitado acirradas divergências entre os mais diversos setores ligados à educação.

Sob o prisma da norma regulamentadora, o tema é objeto do Art. 11 da Deliberação n° 002/05-CME-TOLEDO, o qual preconiza que “o Regimento Escolar disporá sobre direitos e deveres, infrações, proibições e sanções dos membros da comunidade escolar, devendo estabelecê-los em consonância com os princípios constitucionais gerais, a legislação pertinente, em especial do Estatuto da Criança e do Adolescente, do Estatuto do Servidor Público Municipal e as normas do Sistema Municipal de Ensino, e depois acrescenta, em seu Art. 13, que “as normas disciplinares deverão explicitar claramente as infrações e sanções, com sua graduação e instâncias de recurso, de modo a assegurar à criança e ao educando (através de seus pais ou tutores), como ao docente, pleno direito de defesa[sem sublinhado no original].

O que estes dispositivos visam é preservar os princípios que informam o Estado democrático de direito, quais sejam: o princípio da legalidade, do devido processo legal e do contraditório e ampla defesa, e a comunidade escolar, ao elaborar o seu Regimento, deve tê-los como diretriz, em ordem a evitar a ocorrência de eventuais ilegalidades.

A esse respeito, oportuno destacar a advertência feita pelo Promotor de Justiça, Murillo José Digiácomo, em seu artigo “O ato de indisciplina: como proceder”, disponível no site do Ministério Público do Estado do Paraná:

Nesse contexto, é elementar que o aluno acusado da prática da infração disciplinar, seja qual for sua idade, não apenas tem o direito de ser formalmente cientificado de que sua conduta (que se impõe seja devidamente descrita), caracteriza, em tese, determinado ato de indisciplina (com remissão à norma do regimento escolar que assim o estabelece), como também, a partir daí, deve ser a ele oportunizado exercício ao contraditório e à ampla defesa, com a obrigatória notificação de seus pais ou responsável, notadamente se criança ou adolescente (para assistí-lo ou representá-lo perante a autoridade escolar), confronto direto com o acusador, depoimento pessoal perante a autoridade processante e arrolamento/oitiva de testemunhas do ocorrido.

Todo o procedimento disciplinar, que deve estar devidamente previsto no regimento escolar (também por imposição do art.5º, inciso LIV da Constituição Federal), deverá ser conduzido em sigilo, facultando-se ao acusado a assistência de advogado [grifos do original].

Além disso, impende assinalar, consoante palavrar do mesmo representante do Ministério Público:

Também não podemos perder de vista que todo o processo disciplinar, com a cientificação da acusação ao aluno e garantia de seu direito ao contraditório e ampla defesa, possui uma fortíssima carga pedagógica, pois vendo o aluno que seus direitos fundamentais foram observados, e que foi ele tratado com respeito por parte daqueles encarregados de definir seu destino, a sanção disciplinar eventualmente aplicada ao final por certo será melhor assimilada, não dando margem para reclamos (em especial junto aos pais) de “perseguição” ou “injustiça”, que não raro de fato ocorrem (ou ao menos assim acredita o aluno), e que acabam sendo fonte de revolta e reincidência ou transgressões ainda mais graves.

Em suma, se formos justos com o aluno acusado do ato de indisciplina, mostrando-lhe exatamente o que fez, dando-lhe a oportunidade de fornecer sua versão dos fatos e, se comprovada a infração, dizendo a ele porque lhe estamos aplicando a sanção disciplinar, tudo dentro de um procedimento sério, acompanhado desde o primeiro momento pelos seus pais ou responsável, teremos muito mais chances de alcançar os objetivos da medida tomada, que se espera sejam eminentemente pedagógicos (e não apenas punitivos), evitando assim a repetição de condutas semelhantes e ensinando ao jovem uma impagável lição de cidadania, como a instituição escolar, consoante alhures ventilado, tem a missão constitucional de ministrar [grifos do original].

Com efeito, serão nulas de pleno direito e passível de revisão judicial qualquer sanção disciplinar que não observar referidas formalidades.

Acrescente-se, ademais, que na elaboração do Regimento Escolar “a descrição dos direitos e deveres, infrações, proibições e sanções, para as crianças e educandos, devem ser de acordo com sua idade e o nível escolar, evitando-se transcrever citações genéricas e próprias de alunos de idade e de níveis escolares mais elevados” (Art. 13, §2°, da Deliberação n° 002/05-CME-TOLEDO) [sem grifos no original].

Outrossim, deve-se ter muito clara a diferenciação entre ato de disciplina e ato infracional para saber como bem proceder diante da ocorrência de um ou de outro. Sobre o tema esclarecem Promotores de Justiça do Estado do Paraná, Valéria Teixeira de Meiroz Grilo e Sylvio Roberto Degasperi Kuhlmann:

Ato infracional é todo aquele que se caracterize como conduta prevista como crime ou contravenção na legislação penal, e ato de indisciplina corresponde ao comportamento que, embora não constitua crime ou contravenção penal, comprometa a convivência democrática e ordeira do ambiente escolar.

Em se verificando uma ação que seja tipificada como crime ou contravenção por um aluno nos limites internos de uma escola, devem os responsáveis pela instituição comunicar às autoridades competentes, permitindo a devida apuração do ato infracional.

Havendo a prática de ato infracional por pessoa menor de doze anos (definida como criança no Estatuto da Criança e do Adolescente) o caso deve ser encaminhado ao Conselho Tutelar do município e, na falta deste órgão, ao Juizado da Infância e da Juventude, desencadeando-se procedimento para aplicação de medidas de proteção. Caso o autor do ato infracional seja maior de doze anos e menor de dezoito (pessoa adolescente, segundo o Estatuto) a questão há de ser encaminhada à Delegacia Especializada ou ao Promotor de Justiça, permitindo-se a instauração do procedimento destinado à apuração do ato infracional, do qual poderá resultar aplicação de medida sócio-educativa[5] [sem sublinhado no original].

Estabelecidas as penalidades a serem aplicadas, a comunidade escolar, quando da confecção do Regimento Escolar, deve deixar bem evidente qual a instancia escolar encarregada da apreciação e aplicação das medidas disciplinares. Quanto à competência para aplicação das sanções previstas no Regimento Escolar, nos valemos novamente da sugestão dos representantes do Ministério Público acima citados:

É recomendável que se crie, inicialmente, uma hierarquia para a aplicação de penalidades. As menos gravosas e destinadas aos casos de somenos importância podem ser aplicadas pelo professor ou diretor e, as mais gravosas, exigem a intervenção de um colegiado.

Ao professor, faculta-se a aplicação de uma advertência verbal a “chamada de atenção na sala de aula” incluindo-se aqui o esclarecimento quanto à impossibilidade de o professor submeter a criança ou adolescente a vexame ou constrangimento na aplicação da penalidade. Crescendo em gravidade, tem-se, em seguida, a advertência verbal e reservada e, após, a advertência escrita, no caso de reincidência, com comunicação aos pais ou responsável.

Ao diretor compete a aplicação das medidas de advertência escrita, com comunicação escrita aos pais ou na presença dos mesmos, com lavratura de termo de compromisso de colaboração à melhoria da conduta do educando.

Os casos mais graves ou de multirreincidência deverão ser encaminhados à supervisão de ensino ou à orientação educacional. As penalidades impostas pelo professor ou pela direção podem ser revistas pelo colegiado, a pedido do interessado.

No que tange às penalidades aplicadas pelo Conselho Escolar ou pela comissão de disciplina (colegiado), cabíveis para os casos mais graves e de multirreincidência, incluem- se: a advertência; a suspensão da frequência às atividades da classe, por período determinado; a reparação do dano causado involuntariamente ao patrimônio público ou particular; a retratação verbal ou escrita; a mudança de turma e a mudança de turno. A suspensão, vedada no período de provas, não pode implicar em prejuízo ao aprendizado escolar ou, evidentemente, em violação ao direito à educação. Assim, deve o aluno ser retirado da classe, mas mantendo-se-o em local apropriado (biblioteca, por exemplo), onde desenvolverá atividades semelhantes às que estiverem sendo ministradas na sala de aula, preferencialmente pesquisas e redações, as quais serão objeto de análise subseqüente pelo professor para efeito de avaliação do rendimento escolar. Acrescente-se que a suspensão pura e simples, além de violar o direito à educação, vem a conferir ao aluno um indesejado prêmio pelo ato de indisciplina.

A reparação do dano em caso de involuntariedade é da esfera do Conselho ou comissão. Os danos causados voluntariamente constituem ato infracional e devem ser encaminhados ao Conselho Tutelar ou Autoridade Judiciária ou Policial, dependendo da idade do autor. A retratação verbal ouescrita destina-se aos casos de ofensa à honra de colegas de classe, educadores e funcionários.

A mudança de turma, segundo informações dos profissionais da área da educação, muitas vezes regulariza a disciplina do aluno.

A mudança de turno, finalmente, é a penalidade mais gravosa, devendo ser condicionada a sua aplicação à ausência de prejuízo quanto ao trabalho do adolescente [sem grifos no original].

Do exposto, esclarecida a competência de instancia escolar encarregada da apreciação e aplicação das medidas disciplinares, observa-se, ademais, um rol de penalidades que, exemplificativamente, poderão figurar em um Regimento Escolar, sem prejuízo, porém, de outras que reputar convenientes a comunidade escolar, respeitado os princípios indicados nos tópicos anteriores: advertência verbal; advertência verbal e reservada; advertência escrita, no caso de reincidência, com comunicação aos pais ou responsável; suspensão da frequência às atividades da classe, por período determinado; a reparação do dano causado involuntariamente ao patrimônio público ou particular; a retratação verbal ou escrita; a mudança de turma e a mudança de turno.

6. Cumpre realçar, embora nos pareça evidente, a impossibilidade de aplicação de quaisquer sanções disciplinares, o que poderia ensejar práticas arbitrárias. Duas sanções são expressamente vedadas pelo ordenamento jurídico: as que acarretem vexame ou constrangimento ao aluno e a exclusão ou transferência compulsória.

As sanções disciplinares não poderão acarretar vexame ou constrangimento ao aluno, em virtude de que tais situações violam direitos constitucionais de qualquer cidadão insculpidos no art.5º, incisos III, V e X da Constituição Federal, e em tendo por vítima criança ou adolescente, tornará o violador em tese responsável pela prática do crime previsto no art.232 da Lei nº 8.069/90[6].

No que atine à exclusão ou transferência compulsória como sanção aplicável ao aluno indisciplinado, trata-se da única sanção vedada expressamente tanto pela norma regulamentadora estadual quanto pela municipal.

Nos termos do Art. 11, parágrafo único da Deliberação 016/99 do Conselho Estadual de Educação, “a exclusão ou transferência compulsória, como sanção aplicável ao aluno, fica vedada”.

Por seu turno, consoante prevê o Art. 13, §1°, da Deliberação n° 002/05-CME-TOLEDO, “a exclusão ou transferência compulsória, como sanção aplicável à criança ou educando, fica vedada como prática nas instituições educacionais vinculadas ao Sistema Municipal de Toledo”.

Entende-se que a aplicação de tão severa medida afronta o princípio fundamental e constitucional, que assegura a todo cidadão, e em especial a crianças e adolescentes, o direito de “acesso e permanência na escola”, conforme previsão expressa do art. 53, inciso I da Lei nº 8.069/90[7], art. 3º, inciso I da Lei nº 9.394/96 e, em especial, do art. 206, inciso I da Constituição Federal[8].

7. Do exposto, resta ainda saber quais atos de indisciplina devem figurar no Regimento Escolar. Não há um rola exemplificativo de atos de indisciplina, assim não os há em relação às medidas disciplinares a serem aplicadas. Os atos de indisciplina, como visto acima, não como os atos infracionais (que são também, por conclusão lógica, atos de indisciplina), cujas condutas que os caracterizam já se encontram previstas na legislação penal.

Portanto, a caracterização de uma conduta como indisciplinar e sua figuração no Regimento Escolar, dependerá, em grande medida, do bom senso dos envolvidos em sua elaboração, ou seja, da comunidade escolar[9], bem como da experiência pedagógica do corpo discente e especialistas de cada unidade escolar, além, evidentemente, do respeito aos princípios básicos que devem informar o Regimento Escolar, os quais já foram objeto de análise nos itens anteriores.

À guisa de exemplo, a Lei Estadual n° 18.118, de 24 de Junho de 2014[10], “proíbe o uso de qualquer tipo de aparelhos/equipamentos eletrônicos durante o horário de aulas nos estabelecimentos de educação de ensino fundamental e médio no Estado do Paraná”, permitindo, contudo, sua utilização “para fins pedagógicos, sob orientação e supervisão do profissional de ensino”.

Malgrado a existência de lei que regule a matéria, importante que conste expressamente, no Regimento Escolar, a proibição de uso de referidos aparelhos/equipamentos em sala de aula ou em atividades pedagógicas escolares (palestras, seminários, etc.), para fins pessoais tanto por parte dos alunos como dos professores e funcionários. Da mesma forma, o Regimento Escolar deve prever as medidas pedagógicas cabíveis, além das possíveis sanções acerca do abuso deste equipamento.

Concluindo, convém reforçar que “não restam dúvidas que o direito à educação compreende o direito a receber limites e este, por sua vez, traz ínsito o direito a ser corrigido, quando da violação de leis ou regras de conduta, através de medidas sócio-pedagógicas em espécie, intensidade e qualidade adequadas às necessidades de cada jovem.  Evidente que aos direitos a receber limites e a ser corrigido que cada criança e adolescente possui, corresponde o dever de que para tanto concorram todos os encarregados de proporcionar e conduzir sua educação: família, sociedade, comunidade e Estado (latu sensu), que devem agir de forma integrada e articulada, cada qual cumprindo bem e fielmente seu papel definido pelo Estatuto da Criança e do Adolescente”[11] [grifos do original].

É o que nos parece.

Toledo-PR, julho de 2018.

Fernando Rodrigues Batista, Advogado.

OAB/PR: 91.438


[1] JÚNIOR, Carlos S. de Barros. Fontes do Direito Administrativo, in Revista de Direito Administrativo (RDA), v. 28, 1952, p. 1.

[2] Ministério da Educação e Cultura: Departamento de Ensino Fundamental CODEPES. Do Ensino de 1° Grau: Legislação e Pareceres, Brasília: Departamento de Documentação e Divulgação, 1979, p. 280.

[3] Publicado no D.O.E. em 26/09/97 Seção I Página 08.

[4] BOYNARD, Aluízio Peixoto; GARCIA, Edília Coelho; ROBERT, Maria Iracilda. A reforma do ensino: Lei número 5.692 de 11 de agosto de 1971, publicada no Diário Oficial da União em 12 de agosto de 1971. 2. ed. São Paulo: LISA, 1972.

[5] Disponível em <http://www.crianca.mppr.mp.br/pagina-827.html>. Última visualização: 28.06.2018.

[6] Art. 232. Submeter criança ou adolescente sob sua autoridade, guarda ou vigilância a vexame ou a constrangimento:

Pena – detenção de seis meses a dois anos.

[7] Art. 53. A criança e o adolescente têm direito à educação, visando ao pleno desenvolvimento de sua pessoa, preparo para o exercício da cidadania e qualificação para o trabalho, assegurando-se-lhes:

I – igualdade de condições para o acesso e permanência na escola;

[8] Art. 206. O ensino será ministrado com base nos seguintes princípios:

I –  igualdade de condições para o acesso e permanência na escola;

[9] Lembrando que comunidade escolar “é o conjunto constituído pelos corpos docente e discente, pais de crianças ou educandos, servidores e especialistas, todos protagonistas da ação educativa em cada estabelecimento de ensino” e que “a organização institucional de cada um desses segmentos terá seu espaço de atuação reconhecido pelo regimento escolar. (Art. 4°, Parágrafo único, da Deliberação n° 002/05-CME-TOLEDO) [grifei].

[10] Publicado no Diário Oficial nº. 9233 de 25 de junho de 2014.

[11] DIGIÁCOMO, Murillo José. O direito de ser corrigido. Disponível em: <http://www.crianca.mppr.mp.br/modules/conteudo/conteudo.php?conteudo=828>, última visualização: 29.07.2018.

Deixe um comentário